É além de mim precisar em você fisicamente o que me revolve, em algum ponto da mente, estalos sincrônicos, todo o meu corpo parado, viajando por tubos de sensações confortáveis onde tudo é construído a partir do princípio que dará certo. Mas recentemente as ilhas de flutuação sensível, muito além da massa humana cega, embora junto a ela, têm se feito mais e mais concretas, interligando-se em sequência lógica, toda a vegetação respirando em direção a um príncípio comum macrocósmico. Por debaixo das minhas unhas escorre uma vontade quase que inviolável, tão cristalina por sua pureza, constituinte básico de sua estruturação química.
Em toda uma posição imóvel, como numa fotografia, eu consigo agarrar o sentimento que se materializa, uma intuição, ele é o acúmulo de toda a minha história de desejos, toda ela materializada. Construído está o meu desejo eólico feito de ossos que se articulam sob músculos e banhos de canais incontáveis, massa gordurosa e recoberta de pele tão estética; ali está, com a respiração e vontades humanas. Os lábios, assim, movendo-se milimetricamente no ritmo de uma melodia evocadora de emoções sublimes. Cada tonalidade que se alimenta da luz presente revela matizes jamais alcançados de uma profusão multicolorida, envolta por uma fina conexão vital com o tato. Mas minhas mãos, ao aproximarem-se, retesam-se na mesma velocidade... Eu ainda estou como desde o início dos tempos, parado abaixo do sol, olhando para o calor por entre folhas de natureza virgem, clamando sem linguagem por algo que me explique o porquê de eu estar sentindo essa fome nunca saciada, essa fome que repudia alimentos e todos os insetos que me atravessam, eles são a natureza em sua forma mais bestial e completa.
O clímax da canção! A nota mais alta, a mais difícil, a que mais consegue percorrer o caminho entre sua origem imaterial e o príncipio de uma lágrima. Eu avisto um brilho de relance, mesmo que não tenha brilhado. E duvido. Mas não se nega um olho, não se nega o que o físico constata e afastando-me eu me torno cada vez mais conhecedor de mim mesmo, ciente de todas as minhas múltiplicidades e inconstâncias. Eu, quando da mão da Terra, em seus confins fervescentes, irrompi, tal verme arrebenta constituintes humanos, na superfície, alérgico aos raios solares, cerrei minha mão na terra fofa, amassando pequenas folhas de outono espalhadas aos milhares pelo mato verdejante e parcamente iluminado, coberto pela copa das densas árvores ao redor. O cheiro de limpidez abriu meus pulmões e pude distinguir muito vagamente que se tratava de um caminho, um lago, cachoeira discreta, e a vida pulsava naquele ambiente brilhante e multicolorido. Todas as minhas necessidades eram as necessidades ao redor, o saber era íntimo e incontestável, uma espiral de sentimentos afagava todo o meu corpo, acolhendo-me entre a normalidade de ser algo incompleto e sem culpa alguma, completamente limpo de todos os meus pensamentos, eu caminhei por anos sem me cansar.
Ao fundo, em meio ao que vi de mais belamente erguido, a casa que estivera lá há milênios, com a porta aberta e tudo em seu lugar. Como se houvesse passado apenas uma hora, tudo reconhecível e a saudade havia sido como contar cada gota de todos os oceanos. Descendo as escadas, uma palavra soa realmente como ela se configura, nada havia de preocupação e nem desconfiança, tudo estava em seu lugar, mesmo que não houvesse um lugar. Eu nunca saberia se esse seria o destino final, mas uma plenitude, ou a inauguração de uma sensação nos eleva e tudo se acalma. Havia não-sido inúmeras vezes, mas eu conservava em algum canto uma certa inocência pueril de que há o certo. E não importava mais acreditar, pois tudo acabava da mesma forma e a sensação era sempre a mesma e encarada diversas vezes como a última vez, como a melhora por vir. De minha boca, infinitas contradições assolam apenas meus ouvidos e meu corpo caminha contorcido a mando de minha auto-defesa para longe demais do que me maltrataria com delicadeza. Além de todo o mal que eu sempre causei a mim, parece que nunca se desiste de provocar o pior sem piedade. De mãos alheias de si, o nevoeiro de todo um teatro que se passa na minha mente, o sentido intrincado em sua própria linha do tempo, eu me afogo em conclusões que irrevogavelmente me afastam de tudo, mas desta vez eu não tenho tanta certeza ainda. De qualquer forma, algo foi estranhamente composto e a raiva se ergue dentro de mim como pretexto para eu ser forte uma vez. Tudo posto, por que, então, se é, foi anteriormente minimamente sugerido? Eu estou confuso dentro de mim ao ponto de fazer o que sempre faço. E acho a solução a cada vez que viro uma rua, a solução está espalhada, mas jamais a alcancei! Onde era para eu estar agora e onde estou?
Fisicamente começo a existir e a dor é excruciante. Tudo o que me destaca dessa vil massa ambulante pode estar prestes a apoderar-se de mim com intensa simplicidade. Meu distanciamento aprisiona faltas em nome de uma estagnação contemplativa e reflexiva. Mil metros acima do que se julga satisfatório, a observação causa repulsa e ao mesmo tempo medo. Medo de um dia ser irreconhecível. Tudo graças a não poder contar, não poder crer. Uma infinidade de obstáculos de ar pesado.
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