terça-feira, 20 de março de 2012

Verdade

Rasgou sem que eu nem percebesse, essa fenda por onde escorregam partículas geladas. Um frescor interno, ameniza as ideias, com o suor agora é sinônimo de calma e jamais excedendo o limite novamente pelo próximo segundo. E ao contato com a pele, como uma pelúcia verde em tons mesclados, a mistura de aspectos traduz-se no toque em alto relevo. Mas pelo corpo inteiro. Aos meus olhos chegam as paredes de madeira com alguma divisória vítrea ou janela de chão encharcada pela chuva. E algumas plantas. Os móveis organizados em algum alto desse andar térreo, o outro envolto em vendaval macio, os ambientes frescos pela própria natureza, a maciez em cada passo e tudo finalmente consegue se intercalar. Mas como se durasse um fim de semana, as palavras são cheias de normalidade e as surpresas aparecem como momentos luminescentes a partir de mim e eu mesmo, mas agora não mais só nós um. Minha mente evoca sensações físicas as quais não consigo precisar, mas sinto como se me tocassem, produzidas pelo invisível mental, são reais e me confortam tanto quanto me perturbam. Eu consigo perceber algum toque mais sutil do que antes, agora intensificado em mim, passando pelas minhas dúvidas e percebendo minhas incertezas e taxando de mediocridade os meus dias contemplativos, eu quero dragar a sua existência para o meu abismo de divagações e intersecções metafísicas com sortilégios místicos, fumaça esotérica e conclusões holísticas, pesadas exigências de intervenção divina, a música que cheira a chuva e me lembra de meu choro de infância, a razão infantil de eu me magoar está no fundo deste abismo sem fim, eu vou, mesmo sabendo, eu vou descendo cada vez mais e você não consegue ser infinito assim, na sua estagnação controladamente complexa e cautelosamente saudável. Eu estou apaixonado pelos meus ideais. Por onde podemos respirar se estamos debaixo d’água? Mas na minha mente tudo faz tanto sentido, até eu estar imerso vai produzir o efeito esperado, mas você, devagar, me disse, sem falar, que escolher é o que a palavra quer dizer, ausente de opiniões. Eu me segurei para não expressar qualquer obviedade antes de pensar bem e, eu mesmo sabendo que era real, insistia em, sem me dar conta, agir ao contrário. E estou aqui, pronto para ser maior do que eu finalmente e insistindo em diminuir-me. Recostado na cadeira sem cor, eu não vejo ninguém agora e não há mais razão. Só o barulho, o ronronar, a escuridão confortável após um dia de trabalho e eu rasguei meus pulsos pelo simples prazer de amarrar minhas veias umas nas outras. E tudo que eu faria antes, eu faço hoje com outros motivos, com outras pessoas, com outros objetivos e eu entendi quando você me falou sem palavras que eram por ações e eu sem saber sentir senti quando você respondeu o que eu queria de uma forma diferente da que eu queria mas que foi boa também. E eu destruí, naquele momento, um pedaço do meu orgulho. O que eu tinha de melhor era o meu pior. E quando o som coincide com seu som interno, movimenta todas as células com o mesmo ritmo, o corpo inteiro encontra-se com o que sempre fora feito para ser, nenhum corpo, neste estado, é menos que outro corpo que se assemelhe à divindade, eu estou aos pés da música que você toca da ponta dos dedos em contato com o formato dos pensamentos mais íntimos transmutados em guias das suas ações quando nos vemos e nos vemos sempre e estou eternamente plácido de mediocridade ordinária. E o nada me cai muito melhor. Eu consigo me alcançar, um carinho que me entrego, e desejo estar comigo assim, tão intimamente, olhando em meus olhos e sentindo meu próprio beijo, experimentando meu amargor e destilando de mim toda a incúria no trato comigo mesmo e com o universo, eu sinto faltar o ar duplamente, dois corações que se aceleram juntos e as mãos que se afagam, eu sinto a vontade de consumar-me a partir de mim e de sentir-me como outrora seria impossível neste devorar-se voraz de ambas as partes, eu avanço por dentro de mim e sinto como que tendo por inteiro agora, sem nenhuma outra respiração que não a minha, eu percebo meus gestos de prazer mais secretos e a dominação de mim causa o maior prazer antes já sentido por entregar-me ou possuir uma entrega voluntária. Eu relutei em deixar-me. Eu deposito em mim mesmo o que eu sei que tenho, produzido organicamente e levo a boca tudo o que sou de mais intenso e sensível, resvalando por todo o meu corpo que sou, despindo as faces que acreditei serem minhas reais. Eu sou o que brota de dentro de mim. O real, nesta comunhão se evolam todas as minhas faltas e eu me abraço ao fim para ter certeza, eu não preciso mais cogitar, eu me abraço até me entrar em mim pelo corpo inteiro, formando o eu novamente. O eu único. Eu sou eu unicamente em mim e pronto para seguir na busca, o fim nunca haverá.

Ao completar-se uma parte, eu sou agora irrestrito em relação a pulverizar milhões de partes em mim até me sentir completo do que não se pode unificar sozinho.

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