Movendo-me levemente no início,
os espinhos fincados em minha cabeça
despregavam-se
tanto mais forte era de pura
insatisfação o indício
do que me guiava, as amarras
afrouxavam-se.
Envolto por enevoadas brumas
hilariantes
perscrutei toda uma estrada
transparente e povoada
por fantasmas esmeramente desenhados
pelos semblantes
e expressões sorridentes e
convidativas, a alma lavada.
E era o princípio da paz eterna,
mais leve de mim,
todo um asqueroso passado que hiberna,
julgado morto, sem provas de seu fim.
Vem desse passado uma fagulha,
a rasa previsão de um futuro em
miragens
concretizando, antes do meu pensamento,
meras imagens
com o peso final e tamanho de uma
agulha.
Estupefato com a minha vida convergindo
de acordo comigo, como o centro de mim
externado
o universo fazendo sentido, o
sofrimento antes amalgamado
agora desfeito, a compreensão suprema,
o esperado fluindo
E com a força da justiça embrenhada
em tudo o que faço,
por dentre mim, rasgando meu ponto
fraco exposto
meu esqueleto pulverizado, deformado
meu rosto
inerte agora, os olhos vidrados,
impossível qualquer passo.
Por horas estagnado, minha mente um
turbilhão,
eu ainda vagando fora de mim atônito,
um grito afônico,
mas não cabia mais o modus operandi de
até então.
Eu não era mais capaz de ser o de
costume
e uma distração que me elevou para
além do superficial
e se apagou na hora certa, um mal?
Em nenhum momento fora, mas nas trevas
um lume.
Travestido de mil máscaras e adornos,
jóias e panos,
maquiagem e trejeitos, scripts e
planejamentos,
ordem e previsão, desejos moldados há
anos,
vontades artificializadas, cálculos
enfraquecendo momentos...
Era eu, como hoje me vejo, e me despi
de toda a carapaça
e nu, com meus pelos humanos e meus
defeitos e feiúras
caminho pela rua, e o mundo inteiro
passa
ao meu lado e me toca com todas as mãos
duras
de quem não sabe o que é um corpo
humano
as correntezas do planeta fechando meu
primeiro ano.
E neste quarto completamente vazio
espio dentro da minha boca a alguma
procura
de qualquer som esguio
que me dê a resposta, a gota mais pura
de incrível satisfação simplória
em vez de toda a ostentação, para
mim, peremptória
Não havia nada e volto a olhar
as paredes brancas, geladas, são
confortáveis
e a cama, tão doce, tão cômoda, um
mar
onde sinto meu corpo afagar-se, em
ondas amáveis
e posso ser tranquilo novamente
e ser, a todo o tempo do mundo,
ausente.
Que todas as direções me levem ao
ponto de partida,
e passarei por mim sem saber
como numa nova vida
sem ter
o que sempre sonhei que teria
e não tendo é que eu conseguiria
nunca se tem como saber.
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Como pode o ser humano magoar tanto, ser tão gentil, ser tão incoerente, ser tão atencioso, ser tão insensível, ser tão sublime, ser tão patético, ser tão artificial, ser tão cruel, ser tão amável? Eu tiro por mim que sou algo diferente a cada instante, mas sei hoje quem eu sou. E sei mais sobre o que eu quero, ainda que não consiga concretizar tudo isso. Mas eu sei. eu sei onde tenho pisado e onde não quero pisar, eu sei milimetricamente o que se passa e o que todos têm em seus pensamentos, eu consigo ler as mentes do mundo e eles não falam, eles não dizem uma palavra e eu conheço tudo sobre todos e espremo seus coraçõezinhos amedrontados num abraço infinito de amor ou de ódio profundo. O sentimento sou eu agora, completamente humanizado e eu estou em tudo o que todos sentem e compreendo o amor do mundo, mas pouquíssimos de fato amam. A maioria não passa de egoístas, não passa de orgulhosos, não passa de mentirosos falsários. São como os dois pássaros no fio. Mas eu não apenas tentei. Eu voei para bem longe.